Acontece que estou com saudades de fazer postagens nesta seção (desde fevereiro sem nada ser acrescentado) e dá-se, também, que amanhã, 10 de novembro, falecia em 1972, no Rio, o poeta piauiense Torquato Neto. Unindo ambas as vontades, transcrevo, homenageando-o, uma das letras que mais me impressionaram no disco Tropicália, de Caetano. Só conhecia interpretado por ele; hoje, porém, procurando na Internet, ouvi-a por Nara Leão (vejo que Clementina de Jesus também gravou esta composição), e achei o arranjo musical muito sugestivo, além da própria Nara — uma atração à parte. Quem quiser ouvi-la, clique em: http://letras.terra.com.br/nara-leao/331159/
O texto poético constitui-se em uma belíssima construção metafórica das relações familiares cada vez mais robotizadas, indiferentes e distantes no nosso cotidiano. Acho uma verdadeira pérola, uma jóia rara, e é por isto que a compartilho com vocês.
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DEUS VOS SALVE ESTA CASA SANTA
Torquato Neto e Caetano Veloso
Um bom menino perdeu-se um dia
Entre a cozinha e o corredor
O pai deu ordem a toda família
Que o procurasse e ninguém achou
A mãe deu ordem a toda polícia
Que o perseguisse e ninguém achou
Ó deus vos salve esta casa santa
Onde a gente janta com nossos pais
Ó deus vos salve essa mesa farta
Feijão verdura ternura e paz
No apartamento vizinho ao meu
Que fica em frente ao elevador
Mora uma gente que não se entende
Que não entende o que se passou
Maria amélia, filha da casa,
Passou da idade e não se casou
Ó deus vos salve esta casa santa
Onde a gente janta com nossos pais
Ó deus vos salve essa mesa farta
Feijão verdura ternura e paz
Um trem de ferro sobre o colchão
A porta aberta pra escuridão
A luz mortiça ilumina a mesa
E a brasa acesa queima o porão
Os pais conversam na sala e a moça
Olha em silêncio pro seu irmão
Ó deus vos salve esta casa santa
Onde a gente janta com nossos pais
Ó deus vos salve essa mesa farta
Feijão verdura ternura e paz